“Simplicidade é a sofisticação máxima”

A frase é de Steve Jobs, um obcecado pela simplicidade funcional

“Simplicidade é a sofisticação máxima”

O design limpo, amigável tornou-se a marca registrada dos produtos Apple durante a liderança de Jobs. Em uma época carente de grandes designers industriais, as colaborações de Jobs com Hartmut Esslinger na década de 1980 e, posteriormente, com Jony Ive a partir de 1997, resultaram em um design que destacou a Apple entre as grandes empresas de tecnologia.

Essa abordagem não apenas priorizava a simplicidade superficial de uma aparência elegante e organizada, mas também buscava a profunda simplicidade, compreendendo a essência de cada produto, as complexidades de sua engenharia e a função de cada componente. Essa filosofia não apenas definiu a Apple, mas também contribuiu para torná-la a empresa mais valiosa do mundo.

Todo este valor de marca já era retratado na manchete do primeiro folheto de marketing da Apple em 1977: “Simplicidade é a sofisticação máxima”.

O amor de Jobs pela simplicidade no design foi aprimorado quando ele adotou o budismo como prática. Após deixar a faculdade, ele empreendeu uma extensa peregrinação pela Índia em busca de iluminação, sendo o caminho japonês do Zen Budismo o que mais ressoou em sua sensibilidade.

“Sempre achei o Budismo, especialmente o Zen Budismo Japonês, esteticamente sublime. A coisa mais sublime que já vi foram os jardins ao redor de Kyoto”, dizia Jobs.

Jobs também desenvolveu uma apreciação por interfaces simples após retornar da Índia e se juntar à Atari, uma das principais empresas responsáveis pela popularização dos videogames no mundo. Lá, ele colaborou com Steve Wozniak, seu amigo e futuro co-fundador da Apple.

Os jogos desenvolvidos pela Atari precisavam ser suficientemente simples para que qualquer pessoa pudesse compreendê-los, sem a necessidade de manuais ou menus complicados. Esse conceito acabou por influenciá-lo nos anos seguintes.

“Menos é mais”

Jobs começou a participar, a partir de junho de 1981, da Conferência Internacional de Design em Aspen, Colorado. Lá, ele foi exposto à abordagem limpa e funcional do movimento Bauhaus, consagrado por Herbert Bayer nos edifícios, suítes, tipografia sem serifa e móveis no campus do Aspen Institute.

Assim como seus mentores Walter Gropius e Ludwig Mies van der Rohe, Bayer acreditava que o design deveria ser simples, mas com um espírito expressivo. Ele enfatizou a racionalidade e a funcionalidade, utilizando linhas e formas limpas. Entre as máximas pregadas por Mies e Gropius estava “Menos é mais”.

Jobs discutiu publicamente sua adoção do estilo Bauhaus em uma palestra que proferiu na conferência de design de Aspen em 1983, cujo tema era “O futuro não é o que costumava ser”. Em sua apresentação, ele propôs uma alternativa mais fiel à função e à natureza dos produtos. “O que vamos fazer é tornar os produtos de alta tecnologia e embalá-los de forma limpa para que você saiba que são de alta tecnologia. Vamos colocá-los numa embalagem pequena e depois poderemos torná-los bonitos e brancos, tal como a Braun faz com a sua eletrónica.”

Jobs enfatizou repetidamente que o mantra da Apple seria a simplicidade. “A forma como administramos a empresa, o design do produto, a publicidade, tudo se resume a isto: vamos simplificar. Muito simples.””

Produtos intuitivamente fáceis de usar

Jobs acreditava que um componente central da simplicidade do design era tornar os produtos intuitivamente fáceis de usar. Em uma ocasião, ao falar para uma multidão de especialistas em design, Jobs destacou a importância de tornar as coisas intuitivamente óbvias.

Ele exemplificou isso ao elogiar a metáfora da área de trabalho que estava criando para a tela gráfica do Macintosh. Jobs argumentou que as pessoas já tinham experiência em seus escritórios, com papéis sobre a mesa, e essa familiaridade tornaria a interação com o computador mais intuitiva.

Ele explicou: “As pessoas sabem como lidar com um desktop de forma intuitiva. Se você entrar em um escritório, há papéis sobre a mesa. O que está no topo é o mais importante. As pessoas sabem como mudar de prioridade. Parte da razão pela qual modelamos nossos computadores com base em metáforas como o desktop é que podemos aproveitar essa experiência que as pessoas já têm.”

Ao criar o case do Macintosh original, lançado em 1984, Jobs trabalhou com dois jovens designers da Apple, Jerry Manock e Terry Oyama, que elaboraram um projeto preliminar e mandaram fazer um modelo de gesso.

A cada mês, Manock e Oyama voltavam para apresentar uma nova iteração, baseada nas críticas anteriores de Jobs. Todas as tentativas de evoluir o protótipo eram alinhadas ao lado dele. Isso não apenas os ajudava a avaliar a evolução, mas também evitava que Jobs insistisse que uma de suas sugestões ou críticas tinha sido ignorada. Hertzfeld comentou: “No quarto modelo, eu mal conseguia distingui-lo do terceiro, mas Steve sempre foi crítico e decisivo, dizendo que amava ou odiava um detalhe que eu mal conseguia perceber”.

Em um fim de semana, Jobs foi à Macy’s em Palo Alto e dedicou tempo ao estudo de eletrodomésticos, especialmente o Cuisinart. Na segunda-feira seguinte, ao entrar no escritório do Mac, Jobs pediu à equipe de design que comprasse um Cuisinart e fez uma série de novas sugestões com base em suas linhas, curvas e chanfros.

Jobs continuou insistindo que a máquina deveria ter uma aparência amigável, evoluindo para se assemelhar a um rosto humano. Com o drive de disco embutido abaixo da tela, a unidade era mais alta e mais estreita que a maioria dos computadores, sugerindo uma cabeça. A base evocava um queixo delicado, e Jobs estreitou a tira de plástico na parte superior para evitar a aparência de uma testa de Cro-Magnon. A patente para o design do case da Apple foi emitida em nome de Steve Jobs, bem como de Manock e Oyama.

Oyama comentou mais tarde: “Mesmo que Steve não tenha desenhado nenhuma das linhas, suas ideias e inspiração fizeram do design o que ele é. Para ser honesto, não sabíamos o que significava um computador ser ‘amigável’ até que Steve nos contou”.

O amor pela caligrafia

Jobs obcecado com igual intensidade pela aparência do que apareceria na tela. Em particular, ele se preocupava com as fontes – os diferentes estilos de letras. Quando ele abandonou o Reed College como calouro, ele frequentou aulas de audição no campus que lhe agradaram, e sua favorita era uma de caligrafia. “Aprendi sobre fontes com serifa e sem serifa, sobre como variar a quantidade de espaço entre diferentes combinações de letras, sobre o que torna a tipografia excelente”, dizia Jobs.

Como o Macintosh possuía uma tela bitmap, o que significava que cada pixel da tela podia ser ligado ou desligado pelo microprocessador, foi possível criar uma ampla variedade de fontes, desde as elegantes até as excêntricas, e renderizá-las pixel por pixel na tela.

Para projetar essas fontes, Jobs contratou uma artista gráfica da Filadélfia, Susan Kare. Ela nomeou as fontes em homenagem às paradas do trem suburbano da linha principal da Filadélfia: Overbrook, Merion, Ardmore e Rosemont. Jobs achou o processo fascinante. No final da tarde, ele passou por aqui e começou a pensar nos nomes das fontes.

“A forma segue a emoção”

Jobs queria criar uma linguagem de design consistente para todos os produtos Apple. Assim, ele lançou um concurso para escolher um designer de classe mundial que seria para a Apple o que Dieter Rams foi para a Braun. O vencedor foi Hartmut Esslinger, designer alemão responsável pelo visual dos televisores Trinitron da Sony.

Mesmo sendo alemão, Esslinger propôs que deveria haver um “gene nascido na América para o DNA da Apple” que produziria um visual “global da Califórnia”, inspirado em “Hollywood e música, um pouco de rebelião e apelo sexual natural”.

Seu princípio orientador era que “a forma segue a emoção”, uma brincadeira com a máxima familiar de que a forma segue a função. O visual que ele desenvolveu para os produtos Apple na década de 1980 apresentava caixas brancas, curvas estreitas e arredondadas, além de linhas de ranhuras finas para ventilação e decoração.

Mas por que a simplicidade é o melhor caminho?

Porque, com produtos físicos, precisamos sentir que podemos dominá-los. Ao trazer ordem àquilo que é complexo, encontramos uma maneira de tornar o produto adequado a nós. Simplicidade não é apenas um estilo visual, não se trata apenas de minimalismo ou ausência de desordem. Envolve cavar a profundidade da complexidade. Para ser verdadeiramente simples, é necessário ir muito fundo. É preciso entender profundamente a essência de um produto para poder eliminar as partes que não são essenciais.

Esse parece ter sido o princípio fundamental de Jobs. O design não se tratava apenas da aparência superficial de um produto; tinha que refletir a essência do produto.

Leonardo Elppa
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Leonardo Elppa

Especialista em design, com ênfase no estudo de usabilidade e comportamento humano.