O “post mortem” será coisa do passado, no futuro?

Episódio impactante de Black Mirror provoca reflexões sobre a essência humana

O “post mortem” será coisa do passado, no futuro?

Na visão de muitos, “Black Mirror” é uma das produções mais perturbadoras dos últimos tempos.

As pessoas podem se identificar com algumas situações presentes em seus episódios, mas também podem se sentir completamente atônitas diante da distopia e hostilidade tão presentes nesta série.

Lançado em 2011, o seriado tem como foco principal convidar as pessoas a refletirem sobre como a tecnologia pode impactar a nossa sociedade, transformando drasticamente o nosso comportamento.

Cada episódio é independente, com seu próprio universo e estilo, mas que acabam se conectando de alguma forma, na maioria das vezes pelo fato de retratarem as tendências tecnológicas atuais no dia a dia das pessoas.

Qual previsão feita por Black Mirror se tornará realidade? Este será sempre um debate entre os aficionados pela série.

Neste contexto, o primeiro episódio da segunda temporada merece todo destaque. “Be Right Back” trata de um tema muito impactante para nós, seres humanos: a imortalidade, mesmo que em uma diferente (e angustiante) perspectiva.

Ao assistir o episódio, temos a sensação de que encontramos uma maneira de ganhar mais tempo – uma forma de derrotar a morte e o medo de vivermos os nossos dias na Terra distantes do amor, ou melhor, das pessoas que amamos.

A falta do outro é algo que gera medo e inconstância na vida de muitos.

Para contextualizar todo este sentimento, somos apresentados logo no início da história ao casal formado por Ash (Domhnall Gleeson) e Martha (Hayley Atwell).

Nota-se no casal um amor que convive bem com as nuances do mundo atual – cheio de smartphones, tarefas e coisas menores que roubam a nossa atenção todos os dias.

Hayley Atwell e Domhnall Gleeson nas papeis de Martha e Ash, respectivamente. Foto: Netflix (reprodução)

Martha é uma artista, enquanto ele trabalha como entregador. A história começa a ganhar seus contornos quando, em uma manhã aparentemente normal, Ash sai de casa para fazer uma entrega e algo inesperado acontece. Naquele dia, um acidente fatal cruza o caminho do casal.

Neste momento, presenciamos todo o desespero provocado pela sensação de abandono que invade a vida de Martha. Dói muito pensar em uma vida sem aqueles que amamos, e nada mais humano do que esse instinto de autopreservação emocional.

Na tentativa de hackear uma das maiores premissas da jornada humana, a protagonista vai atrás de uma maneira de trazer o seu amor de volta por meio de uma nova versão digital. Seria essa a solução perfeita para acabar com tanta dor e sofrimento?

Infelizmente, Martha descobre que não. Na verdade, todos nós podemos estar errados ao acreditar que a tecnologia pode, de alguma forma, nos substituir, ou pior, substituir nossos sentimentos.

Você já parou para pensar sobre como as nossas lembranças funcionam? Será que quem somos online poderá definir como seremos lembrados no futuro?

Este é outro paradigma presente em “Be Right Back”. O serviço experimental que reconecta os vivos aos mortos no episódio utiliza fotos, vídeos e outros dados disponíveis.

Quanto mais dados você inserir, mais precisa será a “versão” do seu ente falecido. Tudo começa com mensagens de texto, um bot imitando os trejeitos de quem se foi. O segundo estágio é a voz. E então, o nível final: um clone de seu ente querido, cuja estranheza é encoberta pela dor e pela carência de quem contrata o serviço.

Foto: Pinterest by réka szabó

O ponto central de tudo isso são os dados. Quase tudo o que existe online são dados úteis – desde seus e-mails, vídeos caseiros até os cookies de sua navegação na web. E o clone de Ash é inteiramente baseado nesses tipo de informação.

Mas isso não é suficiente para conhecer alguém. Martha percebe que o retrato que os dados fizeram de seu marido não é totalmente preciso.

Os detalhes pertencentes à essência humana não podem ser medidos e quantificados.

A história de Ash, assim como a sua, não está na internet. Seus sonhos, desejos e amores não são um amontoado de bytes e bits.

Não se deixe levar por aquilo que não somos. Duvide, sempre, de tudo o que não te faz humano.

Vinicius Debian
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Vinicius Debian

Cofundador & Chief Digital Officer da Bigtrade S/A, Fundador da brandtech NEIL e da plataforma Faça Parte do Futuro. Defensor do design - e de uma vida - simples e funcional, sempre! Trabalhando com design, tecnologia e inovação desde 1998.